quarta-feira, 17 de agosto de 2011

Alimentação láctea


Alimentação láctea no primeiro ano de vida

O conhecimento atualizado e correto sobre a  alimentação da criança sadia é essencial para que seja feita avaliação e orientação adequada sobre a sua nutrição, o que tem papel fundamental na prevenção e/ou tratamento de doenças.  A OMS recomenda o aleitamento materno até os dois anos de idade, sendo exclusivo até os seis meses, seguido da introdução de alimentos complementares ao seio após esta idade. O aleitamento natural deve ser iniciado imediatamente após o parto, sob regime de livre demanda e sem horários pré-fixados, estando a mãe em boas condições e o recém-nascido com manifestação ativa de sucção e choro.  Quando a criança está em aleitamento exclusivo não é recomendada à introdução de líquidos (água e/ou chá).  Além dos benefícios nutricionais, imunológicos e psicossociais, o leite materno representa a melhor fonte de nutrientes para  o lactente por conter proporções adequadas de carboidratos, lipídios e proteínas necessárias para o seu crescimento e desenvolvimento. Apesar do reconhecimento de que o aleitamento materno, na nutrição do lactente jovem, é fator redutor da morbimortalidade infantil e uma questão de sobrevivência para a maioria das crianças, principalmente nos países em desenvolvimento, o desmame precoce ainda é uma realidade no Brasil.  O consumo precoce dos alimentos complementares, principalmente do leite de vaca integral, tem provocado a interrupção do aleitamento materno. Este leite não supre as necessidades nutricionais do lactente que está  com elevada velocidade de crescimento, tornando-o mais vulnerável tanto à desnutrição quanto a deficiências ou excessos de certos micronutrientes, com manifestações a curto ou a longo prazo.  
Em algumas situações, pode ser necessária a introdução de outro leite que não o materno, ou a complementação deste, tais como:
  Alguns erros inatos do metabolismo;
  Filhos de mães portadores do HIV;
  Mães que usam drogas que contra indiquem o aleitamento materno;
  Mães que devem retornar precocemente  ao trabalho e com dificuldades para continuar amamentando durante este período;
  Mães que não conseguem amamentar, por razões diversas, apesar das orientações do Pediatra; 
  Lactente menor de seis meses que não está crescendo e se desenvolvendo adequadamente, apesar da técnica de amamentação estar correta e das investigações e orientações já feitas. 
Na ausência do leite materno, as fórmulas  infantis são as mais apropriadas para substituí-lo na alimentação da criança no primeiro ano de vida, uma vez que possuem composição nutricional adaptada à velocidade de crescimento do lactente, prevenindo o aparecimento de doenças relacionadas aos excessos e às deficiências de nutrientes. Como as composições do leite humano, do leite de vaca integral e das fórmulas infantis diferem bastante, a escolha do alimento a ser fornecido aos lactentes impossibilitados de alguma forma de serem amamentados, gera impacto nutricional importantíssimo. Comumente utilizado de forma inadequada  para substituir ou complementar o leite materno, o leite de vaca integral é um alimento de alto valor biológico que, para ser apropriadamente metabolizado pelo lactente,  deve sofrer uma série de modificações para adequar-se à sua capacidade digestória, renal e necessidades nutricionais. De acordo com as recomendações do CODEX Alimentarius da FAO/OMS (1994) as fórmulas infantis, satisfazem as necessidades nutricionais deste grupo etário (Portaria 977/98 SVS/MS). Por serem nutricionalmente equilibradas e balanceadas, colaboram para proporcionar crescimento e desenvolvimento adequados aos lactentes.   Vários estudos mostram que o leite de vaca  integral tem quantidade insuficiente das vitaminas D, E e C e de alguns oligoelementos, principalmente ferro e zinco, para suprir as necessidades do lactente. Além disso, o leite de vaca integral quando fervido e diluído, diminui os níveis das vitaminas do complexo B, podendo levar a quadros carenciais.  Mesmo após os seis meses de idade, com a adição de outros alimentos fortificados com ferro, há comprovação de que o leite de  vaca integral não supre as necessidades deste oligoelemento. A própria composição do leite de vaca integral, com excessivo conteúdo de cálcio e fósforo e baixa quantidade de vitamina C, contribui para diminuir ainda mais a biodisponibilidade de ferro oriundo de outras fontes alimentares. O ferro é um micronutriente fundamental na dieta do lactente, uma vez que além da anemia, sua deficiência está associada ao retardo do desenvolvimento neuropsicomotor e intelectual, bem como à diminuição da imunidade celular e da capacidade fagocítica e bactericida dos neutrófilos.  O consumo regular do leite de vaca integral nesta faixa etária, pode também levar a sensibilização precoce da mucosa intestinal e induzir hipersensibilidade às proteínas do leite de vaca, predispondo ao surgimento de doenças  alérgicas e de micro-hemorragias na mucosa intestinal, o que contribui ainda mais para o aumento da deficiência de ferro. Comparado ao leite materno, o leite de vaca integral possui menor valor calórico, menor concentração de lactose e menor teor de gorduras, com predomínio de ácidos graxos saturados que contribuem para o retardo do esvaziamento gástrico. Além disso, o leite de vaca integral possui baixos teores de ácido linoléico (10 vezes menos que nas fórmulas), comprometendo a síntese de LC-Pufas, fundamentais para a resposta inflamatória e estruturais como membrana celular e SNC. Na elaboração das fórmulas infantis, com o objetivo de melhorar a digestibilidade, há redução na quantidade de gordura animal saturada (desengorduramento), que é substituída por  óleos vegetais ricos em ácidos graxos poliinsaturados de melhor qualidade, principalmente ácido linoléico, importante para o processo de mielinização e maturação do SNC e estruturação da retina. O sistema digestório e renal do lactente são imaturos, o que os torna incapazes de lidar com alguns metabólitos de alimentos diferentes  do leite humano. Lactentes alimentados com leite de vaca integral ingerem altas quantidades de sódio, potássio, cloretos e proteínas, elevando a carga de soluto renal com risco de hipertensão arterial tardio.  As alterações feitas no processo de fabricação das fórmulas infantis fazem com que elas tenham as seguintes características:
  Por serem acrescidas de lactose ou amido (maltosedextrinas) não necessitam de adição de açúcar ou farinha;
  A quantidade de proteínas é reduzida e em alguns casos acrescenta-se proteína solúvel, melhorando a relação  caseína/proteína solúvel, favorecendo a digestão e absorção;
  São enriquecidas com minerais tornando o leite de vaca mais adequado ao organismo da criança;
  Têm uma melhor relação cálcio/fósforo, favorecendo a mineralização óssea;
  São enriquecidas com vitaminas e oligoelementos, destacando-se o ferro;
Algumas fórmulas são acrescidas de nucleotídeos, compostos nitrogenados com provável efeito protetor contra processos infecciosos por aumentarem a atividade das células NK, a produção de interleucina2, a colonização do intestino por bifidus bactérias e diminuírem as enterobactérias;
Algumas fórmulas são acrescidas de probióticos, com importante papel na promoção do equilíbrio da microbiota intestinal e do estado imunológico do organismo. O leite materno é o padrão de referência em alimentação infantil para a composição das fórmulas. Nos últimos 40 anos, as fórmulas vêm sofrendo constantes modificações para melhor se adequar às necessidades do lactente. Este avanço tecnológico das fórmulas permitiu elaborar  produtos no sentido de compensar certas deficiências digestivo-absortivas, reações alérgicas e até mesmo contribuiu para diminuir a desnutrição. As fórmulas infantis são regulamentadas pelo Codex Alimentarius FAO/OMS que com as normas técnicas, pretendem garantir ao lactente a qualidade nutricional, a digestibilidade, a competência imunológica, o equilíbrio metabólico e excreção, além da qualidade microbiológica.  Todos os nutrientes das fórmulas infantis devem variar suas concentrações dentro dos limites estabelecidos pela FDA americana, que em última análise são muito semelhantes às recomendações da Academia Americana de Pediatria através de seu Comitê de Nutrição que segue as DRI ou RDA, que são equilibradas e atendem às necessidades nutricionais da criança. A utilização do leite de vaca integral pelo lactente, mesmo que diluído, é um dos mais sérios erros alimentares. Escolher uma fonte láctea adequada faz parte da manutenção da nutrição do lactente e é uma responsabilidade do Pediatra. Existem no mercado as fórmulas infantis de partida (até sexto mês de idade) e de seguimento (após sexto mês) para os lactentes saudáveis, as para os prematuros que devem ser utilizadas até 60 dias de idade corrigida e também as especiais, para atender necessidades específicas. É de extrema importância que o Pediatra estimule o aleitamento materno e quando não houver possibilidade, o profissional deve conhecer as fórmulas infantis disponíveis e suas peculiaridades para saber orientar a melhor opção para cada caso. Os distúrbios nutricionais sofridos no primeiro ano de vida vão determinar o futuro da criança, privando-a de alcançar o seu potencial máximo de crescimento e desenvolvimento. Diante disso, o Pediatra deve estar atento quanto à introdução de outro tipo de leite neste período, orientando a opção mais apropriada para nutrir, de modo balanceado, o lactente desmamado. 
Portanto, na impossibilidade do aleitamento materno, recomendamos que o leite de vaca  integral (líquido ou pó) não seja utilizado na alimentação durante o primeiro ano de vida, mesmo em suas preparações diluídas, com também recomenda a Sociedade Brasileira de Pediatra (SBP), a Academia Americana de Pediatria (AAP) e a Sociedade Pediátrica Européia de Gastroenterologia, Hepatopatia e Nutrição (ESPGHAN). A alternativa aceitável, em substituição ao leite materno, são as fórmulas infantis regulamentadas pelo Codex Alimentarius FAO/OMS, por serem equilibradas e atenderem as necessidades nutricionais do lactente.

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